terça-feira, 3 de setembro de 2013

Já não se pode ser feia



Será até um dos muitos mitos urbanos de tanto que se enfatiza a importância que se atribui à beleza interior. "Ahhh, fulana é linda por dentro e por fora", ou "não interessa a aparência de cicrano, mas sim o interior, aí sim se encontra o verdadeiro encanto". A mim, confesso, dá-me uma instantânea vontade de rir, quando aquele filme paralelo que tem acompanhado a minha vida, aquele que - qual vida de Brian - segue direitinho o meu raciocínio normal a cada situação, mas em versão cómico-apalermada: Beleza interior? Ah sim, deve ser uma beleza o cheirinho do estômago, e o burbulhar acre dos sucos então devem ter cá um encanto... e os intestinos? Bom, nem me adianto no caminho fácil e previsível de pensar na piadola escatológica... 
A beleza existe. Em todo o lado que se olhe. Basta ver o ângulo certo de cada objecto, ser ou momento. Devia ser obrigatório activar a tecla do sentido estético à nascença, mas aí, já nem faria sentido nada do que estou a escrever. 

É o cliché Síndrome da Beleza Exterior/Interior, ou até - o do meu filme cómico - que poderia chamar naturalmente de Síndrome Bota da Tropa/Bebé Beatle... (ok, ok, eu explico). 

Quando nasci, contam que vinha com uma guedelha que teve de ser cortada (penso que terá mesmo sido com a tesoura do umbigo), porque a minha proverbial franja era então uma melena que me dava pelo queixo. Ora sendo o ano de '63, logo as enfermeiras me deram a original alcunha de Bebé Beatle.
Lembro da minha avó contar que, olhando o berçário, outra avó lhe perguntou qual seria o neto, a que graciosamente a minha avó respondeu tufando o peito, a menina mais bonita, a que tem cabelo.
Ora se nasci gira e era gira na escola ou no local onde a família passava férias, em abono da verdade isso constituía um facto que vivia comigo a que, com toda a sinceridade, cresci sem nunca ligar.
Cresci meio maria-rapaz muito mais preocupada no prazer de andar de bicicleta, subir às árvores sempre na chinchada ou bater nos rapazes para defender a minha irmã.
Quando algum moço mais afoito pensou em derriço para o meu lado, e soltou a frase: Ah és tão gira, respondi-lhe secamente: E...? 
Hoje, cá do alto dos meus quase 50 anos, sei que se tivesse nascido feia-feinha como uma bota da tropa, teria certamente ligado e muito a esse simples facto. Muito provavelmente ter-me-ia resguardado na grande personalidade e na imensa beleza interior que certamente (definitivamente!) teria em minha defesa. 
E agora pergunto: e porque é que uma bota da tropa tem de ser feia?, e o que é que vem à lembrança? (lá está ela...) Recordei esta foto que há dias visualizei numa rede social, dessas que todos usamos e por ter achado uma ideia bem gira.
É a forma como olhamos o que nos envolve: Tudo, mas tudo tem o seu encanto. E olhando pelo cantinho certo, pelo ângulo que mais ninguém se incomodou de vislumbrar, descobrimos que nem uma bota da tropa consegue ser feia. 



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