sábado, 24 de dezembro de 2022

Um pequeno conto de Natal

Tinha chegado o momento de abrirem os presentes e a mãe foi sentar-se no sofá, bem junto do filho. 

O pai acompanhou-a no gesto, sentando-se do outro lado, reacomodou-se até que os joelhos tocassem os do filho e, acto-contínuo, pousou no colo dele uma caixa leve, rectângular, indicativa de mais um par de sapatos de ténis. Enquanto desembrulhava, a mãe olhou para o pai e pousou a mão no joelho do filho, e o pai, repetiu o gesto. 
O jovem ficou pasmo, ao abrir a caixa e desvendar pela translucidez da tua folha de papel de seda, com que dentro da caixa, envolviam um inesperado par de sapatos. Retirou-os da caixa, sem palavras. A mãe acariciou a pele macia dos sapatos e encaminhou a sua mão pelo corpo do filho até chegar junto ao coração. O pai, sem quebrar o silêncio que gritava na sala, levantou o braço, passou-o pelos ombros do rapaz e, sentiu-o, tremular. A mãe também compreendeu o medo ou embaraço que o jovem poderia estar a sentir, quiçá acuado, a ponderar que era agora ou nunca e teria de falar ou calar-se, numa eterna negação. 
Então a mãe, esfregando o peito do filho, enroscando o outro braço no do marido, criando um elo de tranquilidade e amor, disse ao seu trémulo filho: 
- Meu amor, tu sabes que, a nós, podes contar tudo! 
O jovem ainda atemorizado, olhou para a mãe e, no encontro desse olhar, só viu paz, amor e anuência. 
O pai apertou o afago do abraço, enleando ainda mais o jovem filho e disse-lhe garantido: 
- Sim, connosco e com todo o mundo. Esta é a tua vida, meu filho, vive-a intensamente, voa, brilha, sê feliz! 
A mãe rematou: 
- Esconde dentro de ti o que, desde sempre, não foi invisível aos nossos olhos. 
O filho respirou fundo, demorou a responder enquanto pousava os sapatos no colo e se embrulhava no abraço quentinho com os seus pais, deixou-se por fim aninhar. 
Respondeu em forma interrogativa: 
- Sempre souberam…? 



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