Ontem, na correria do meu dia-a-dia e distraída com os meus pensamentos, ao assomar uma entrada para um MB, percepcionei pela visão lateral - porque na verdade nem quis olhar de frente - um casal, em que um dos homens estava encostado à parede, e o outro debruçado sobre ele, o abraçava e beijava. Foi uma escolha momentânea, eu sei: entrei e não quis olhar para não parecer preconceito da minha parte (até porque assim não sou, nem me considero) e, na verdade, fui-o em grande escala.
Não tendo tido sorte de usar o multibanco dentro de portas por ser exclusivo para os clientes com caderneta, dirigi-me ao fora de portas onde tinha acabado de passar pelo casal. Fiquei sem reacção: assim que saí uma querida amiga minha e companheira de muitos anos nesta nossa atribulada vida de mães de autistas cumprimenta-me: "Olá Ana!" Continuei sem reacção sem querer acreditar no que todos os meus sentidos já me gritavam e gelei por me sentir tão estupidamente horrorizada com o meu anterior pensamento.
No momento seguinte estava rodeada pelo seu marido e o filho autista, também já adulto, como o meu, que me deu um carinhoso beijo bem babado.
Eram pai e filho encostados, ali naquela parede, em que os julguei precipitada e preconceituosa!
Consegui esboçar as palavras habituais num ritual de cumprimento, mas percebi a estranheza da minha pouco habitual efusividade no olhar inquisitivo da minha amiga, mas eu estava ainda naquele torpor perturbador do que acabara de sentir e estava tão indignada por ter feito o que critico, que simplesmente fiquei queda, sem acção. Pouco habitual em mim, é certo. Tanto a quietude no abraço e sorriso fraterno quanto a estupefacção do sentir-me preconceituosa.
Sai daquele breve encontro perturbada. O filho dos meus amigos está um homem de 1,70 e muitos de altura, tal como o meu filho. Num primeiro olhar são tão "normais" e como momentaneamente não parecem aos olhos de quem os não conhece, ou desconhece o significado ampliado da palavra autismo, causam estranheza.
O meu filho abraça-me, amassa-me, beija-me na boca na rua, ou então mesmo em público mexo-lhe amiudamente na braguilha para o compor (sempre com fecho abertos!) e sei que o olhar que têm para connosco é idêntico ao que eu mesma fiz com os meus amigos. Convivo com isso e respondo pondo as pessoas no sítio apenas com um olhar.
Simples, habituei-me. Mas não me conformei. Não me vou conformar nunca!
A falta de informação sobre esta população e as suas famílias é gritante, sim. Eu sou a que quase agarro as pessoas pelo braço e pergunto, está a olhar? Não sabe o que é uma pessoa com autismo? Venha cá!, que eu explico.
Da próxima vez que se deparar com outra pessoa com autismo, pelo menos questione-se antes de julgar e vai entender as reacções que não são habituais ver, as frases proferidas em voz alto ou fora de contexto, todo um mundo que lhe parece estranho, é apenas porque o desconhece. Venha cá, que eu explico!
E sim, explico, tranquilamente.
Faço muitas acções de sensibilização muitos dias após ou antes o 2 de Abril, e sei que o farei a vida toda.
Consciencializar, consciencializar, sempre! 365 dias ao ano.
Em algum momento chegamos lá.
É uma certeza em mim. Em muitos de nós.
2 comentários:
..enquanto você aprende,
também nos ensina!
a vida é isso!
Ana querida,
vim desejar-te uma feliz
Páscoa e que o renascimento
do Cristo seja para todos nós
bençãos do céus, hoje e Sempre!
bjs doces desde um Brasil
outonal!
obrigada querida Vivian
um abraço deste lado do Atlântico!!
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