terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Mesinha de Cabeceira #4

de 22 fevereiro 2010



Hoje trago:
«Um Livro» de Hervé Tullet





Perguntaram-me como faço a minha selecção a cada semana e gostaria de explicar aos nossos ouvintes: Há uma loja de que gosto muito, a Livraria Dharma, onde vou sempre procurar as novidades para fazer esta crónica e a dona, a Carla, permite que traga para casa os novos livros da semana para que analise e faça a minha escolha. Ter os livros comigo em casa é uma pesquisa completamente diferente e gostaria de publicamente aproveitar o ensejo para agradecer à Carla da Livraria Dharma.
Para hoje quedei-me na secção dos livros infantis, particularmente num tão visual que pensei ser um desafio engraçado explicá-lo aqui na rádio, sem o suporte da imagem.
Conseguem imaginar um livro simples que se chama UM LIVRO e que por ilustrações tenha apenas bolas? Vou tentar que o imaginem: começa com uma bola amarela e um pedido – carrega neste círculo amarelo – o que qualquer criança responde com a ingenuidade que nós adultos já perdemos e cinicamente pensamos que nada acontece se carregarmos numa bola amarela numa folha de papel. Mas estamos enganados. A criança carrega e ao virar a página acredita nas duas bolas amarelas que estão previamente impressas. E ao novo pedido na página seguinte estarão três e a criança sorri. Depois há outro pedido que esfregue o círculo amarelo da esquerda. De notar que o adulto compreende que se está a introduzir a noção de lateralização com a brincadeira e ao virar a página, a cor dessa bola mudou. É a noção das cores que aparece com um sorriso e nesse momento a criança tira-nos o livro da mão e acha-o mágico, mas o adulto já se deixou encantar pela brincadeira e não deixa que a criança descubra a etapa seguinte e já estão ambos sentados no chão e este livro, que é apenas um livro com bolas, já conquistou o seu público.
O meu filho já não tem idade para este livro, poderia pensar, mas eu quis brincar com ele e ver a reacção às sucessivas etapas. Carregou, esfregou e sacudiu a cada pedido. Quando tirou o livro das minhas mãos encantou-me e de repente tinha o meu filho pequenino de volta num simples jogo e aquele livro com bolas voltou a fazer magia por uns segundos.
O pedido que mais gostei, é que o livro seja inclinado e todas as bolinhas descaem para o lado esquerdo e depois ao contrário e parecem rebolar para o lado direito. Brincam com o leitor pedindo que toque, esfregue, incline, abane e sopre, com mais força, mais devagar e as luzes apagam-se e acendem e quando se pede palmas e mais força nas palmas as bolas crescem e crescem até quer toda a página seja amarela! E no fim, tal como no princípio, o livro acaba com uma bolinha amarela incitando a que se jogue outra vez.
Eu? Já não o fiz com o meu filho. Perderia a magia de o ter visto bebezinho de novo, mas para quem tenha filhos pequenos, aconselho O LIVRO.
Como nota de rodapé, gostaria de terminar com uma nova editora de livros infantis que apareceu, a Bags of Books Edições, com uma mestria nas ilustrações que me encantou feitas com pedaços de tecidos e botões alinhavados ou papéis recortados fazendo um apelo simpático à reciclagem mas com um grafismo dos nossos dias.




quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Rodrigo Leão

Descobri apenas ontem esta música tranquilamente viciante do Rodrigo Leão numa nova versão com um saboroso refrão em criolo cantado por Mayra Andrade que não resisto a partilhar.

Rodrigo Leão - Just One Day




















terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Mesinha de cabeceira #3


de 15 fevereiro 2011

Hoje trago:
«Cartas de Amor» de Pablo Neruda


Há um livro que sai esta semana pela D. Quixote que quero destacar: As cartas de amor de Pablo Neruda para a sua Matilde Urrutia, a publicação de postais, cartas e bilhetes furtivos do período de amor proibido, até ao final de suas vidas, já casados e com um amor maduro, dos anos ‘50 até à morte do poeta em Setembro de ’73.
Na mesma altura que vem a lume haver provas de um outro amor proibido no final da sua vida, um segredo bem guardado pelos amigos de Neruda, em que a amante furtiva seria Alicia Urrutia, uma sobrinha de Matilde que descobriu tudo e expulso-a de casa, é a mesma altura que sai este cartas de amor e percebemos a força desse sentir que pulsa nesta obra.
É um livro que apetece ler, descobrir, saborear. Esta colectânea tem um grafismo apetitoso. Dispõe os bilhetinhos, postais e cartas reproduzidos a cores, e sentimos como Neruda os escrevia. Escondido, enquanto viajava com Delia, a legítima antes de Matilde, ou enquanto assistia a congressos ou até quando dava um salto de fugida aos correios. A forma como datava as missivas é igualmente original. Poderia ser o dia, o mês, com ou sem ano, ou como mais gostei: “Hoje sábado”. Percebemos pormenores como quando uma caneta falha e ele a substitui, os erros ortográficos, os desenhos engraçados que acompanham os bilhetes, as gralhas quando estreia uma máquina de escrever que confessa não ter muito jeito, sempre com um sentido de humor e ternura que nos comove e dá vontade de mais.
Para terminar, são várias as passagens que eu poderia escolher como a melhor para vos ler, mas prendi-me com esta despedida que achei francamente original. Não diz de que ano, datou apenas “Paris 28”, mas presume-se que seja do inicio do relacionamento, 1950.





segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Dia dos Namorados (ou o Dia-Oficial-do-Manel-levar-a-Maria-à-rua)

Um conto. Do meu livro MAL ME QUERO.


Amy Winehouse - Cupid 

Irene já se tinha esquecido, há muito tempo prometera a si própria que nunca mais sairia à noite num dia de namorados. Mas aconteceu. Com amigas, alheadas da comemoração, na sua nova "solteirice", combinaram ir todas ao jantar no japonês.
Ao entrarem no restaurante habitual depararam-se com um invulgar burburinho - infernal!, nem conseguiam avistar o dono! Todas as mesas estavam preenchidas apenas com casalinhos, até ao redor da zona Teppan-yaki – coisa que pretendiam – estava ocupada por parzinhos, claro!, restaurante da moda e caíam lá todos que nem tordos na noite de saída!
"Socorro! Saímos no Dia-Oficial-do-Manel-levar-a-Maria-à-rua!!!!" - Brincou.
Alguém sugeriu mudar de restaurante, mas não adiantaria àquela hora, sem marcação, estariam todos a transbordar de Manéis&Marias.
Antes, imagina-os:
Olhou à volta. Irene não tinha nada a opor ao amor ou a sua celebração, apenas o que chamava de “Dia Oficial”, uma representação patética do que deveria ser, por definição, celebrado todos-os-dias-e-todas-as-noites-das-nossas-vidas.
O Manel pespega uma beijoca à sua Maria logo pela manhã antes de sair para o trabalho – ela falou tanto nisso na véspera, entre o intervalo do futebol e o creme de noite que ele teve pesadelos do mês sem sexo que, sabia, ela imporia, se ele ousasse esquecer...
A Maria, nesse dia sorri feliz, usa roupa nova, vai ao cabeleireiro – muita laca, muito caracol – compra um postal cor-de-rosa já preenchido, tipo-basta-assinar e uma prendinha bem fofinha para o seu Manel pôr no carro – coisa que ele jamais usará ao lado do galhardete do seu clube do coração...
O Manel, mais pragmático, compra o que ela discretamente lhe pediu durante a última semana toda, incluindo, a seguir à beijoca matinal sem sumo.
A Maria papagueia com as suas colegas de trabalho onde poderá ser levada mais logo a jantar. Todas graciosamente fazem crer umas às outras que não sabem o local e/ou a prenda.
O Manel, à tardinha, entre bejecas e tremoços, ri com os amigos que, este dia dos paleios cor-de-rosa, até foi uma coisa bem inventada: é uma noite que seguramente elas não irão passar a ferro até tarde, lhes doerá a cabeça ou terão o período...
A Maria já passou em casa da Mãe, depositando os filhos com um bem disposto: “Até amanhã!”
O Manel foi à florista.
A Maria chegou a casa mais cedo, tomou uma chuveirada e rapou os pêlos.
O Manel passou horas na fila da florista, rosnando.
A Maria passa o gloss mais uma vez pelos lábios ainda bonitos e com pouca procura.
O Manel chega a casa com um previsível ramo de rosas vermelhas, reclama por lhe ter custado 50 euros e, claro, «a» prenda.
Ouve-se na casa do Manel e da Maria uma palavra inusitada: Amo-te
Saem para a rua. Está tanto trânsito como de dia. Vão a um restaurante com folhas de papel branco por toalha.
O Manel pensa: “A TV desligada, que má sorte a minha, espero que alguém repare... se digo alguma coisa, lá se vai a queca.”
A Maria suspira: “Ele vestiu a camisa mais velha, logo hoje... qualquer dia rasgo-a e faço panos para os vidros.”
Irene respirou fundo e olhou em volta enquanto ainda esperavam mesa. Sentiu um ambiente dengoso nas mesas. Não se distinguia a música do ruído. Contrastava a elegância dos pratos deste espaço usualmente relaxante, seguro pela perplexidade serena dos empregados com o frenesim de tão inusitados clientes que até pediam, imagine-se... karaoke.
Irene lembrou-se daquela outra noite, não há tantos anos em que ficara inoculada da noite dos namorados. Presa num extraordinário trânsito para aquela hora tardia, olhou à sua volta: Estupefacta, viu o Manel ao volante com a Maria ao lado em todos os carros! Havia a versão casados-há-muitos-anos visivelmente enfadados pela demora e os namoradinhos que ainda disfarçam hostilidades cortesmente. Olhara para o João, o seu marido, para o seu olhar vazio esperando que o trânsito fluísse. Sentiu um arrepio: era apenas mais um Manel, o que, lamentavelmente, fazia dela mais uma Maria.
Decidida a que o Manel e a Maria não lhe estragariam mais nenhuma noite, olhou de novo à volta, desta vez com a sua firmeza acutilante.
O frete.
Estavam todos a fazer frete! Tinham saído à rua somente porque tinham de fazê-lo!... Todos sorriam complacentemente enquanto gramavam polidamente a estopada.
Todos não.
De indicador em riste anunciou, peremptoriamente, às suas amigas cansadas de estar em pé:
“O único casal a sério nesta sala, é aquele ali do canto.”
“Como sabes?” Perguntara a Bárbara.
“Sei. Sinto. São os únicos que estão a conversar.” Argumentou encolhendo os ombros.
Contrapuseram, estando num restaurante repleto de sons estridentes, com outros pares que tagarelavam demasiado alto.
“Estão apenas a falar. Reparem no olhar, estão apenas a falar, não estão a conversar.”
“Na mesa mesmo atrás de nós estão os piores espécimes de Manéis&Marias – sussurrou rindo a Maria Clara enquanto se sentavam – os broncos!
Olhavam causticamente para trás. Versão cromanhon-namoradinhos, diziam à socapa. Tinham de estar dois pares à mesa! Claro!... aos pares, se não, com quem é que eles haveriam de conversar???
Sem estranheza, Irene ouviu um dos rapazes protestar bem alto, com os pauzinhos em riste, pedindo talheres de gente, o outro palerma reclamar do peixe estar mal passado, uma das Marias dizer que o gengibre eram «pétalas de flores comestíveis», que «tinha lido numa revista» até ao momento hilário em que um comeu de uma só vez o “pistachio”, urrou que nem um urso que o tinham enganado, parece que afinal picava... sem mencionar a boa parte da noite a ouvi-los contar anedotas pouco edificantes sobre mulheres... que apropriado! – pensou – mas o melhor ainda estava para vir. Quando entrou uma figura típica da noite, empunhando a habitual braçada de rosas, uma daquelas Marias deu uma valente murraça na mesa afiançando ferozmente:
“Eu hoje vou querer uma rosa!!!”
Até os outros Manéis&Marias das demais mesas tiveram dificuldade de suster o riso... Resta acrescentar o que já todos sabíamos, se calhar, até ela: não a teve.
A pouco e pouco todos os Maneis e Marias foram saindo. Era noite de festa lá em casa ou no banco traseiro do carro! Há casais que são abusivos durante todo o ano, seja verbal, física ou psicologicamente, mas Deus os livre de não festejarem o dia dos namorados!
Ficaram embrenhadas na conversa boa e no último sake gelado, depois do ritual de sabores nipónicos numa refeição memorável onde, como manda a tradição, nem um único bago de arroz foi desperdiçado, quando o tema de início de conversa, voltou à baila: As únicas mesas ainda ocupadas, agora sim, naquele tranquilo e prazenteiro restaurante, eram apenas a das amigas e a do tal casal do canto.
Ficaram a reparar e comentar ostensivamente nos detalhes sem que nunca sequer dessem conta. Era a mulher que estava virada na direcção delas. Tal como as amigas, não tinha estreado roupa nova, não tinha ido ao cabeleireiro, não havia nenhuma rosa vermelha do ké-frô na mesa.
Era particularmente bonita, como só uma mulher segura de si consegue pôr um lápis a segurar-lhe o cabelo, vestir uma qualquer t-shirt branca com jeans e... estar bem.
Irene entretanto contava uma situação que ouvira num supermercado na véspera. Estava no corredor dos desodorizantes quando tomou atenção numa frase: “Olha, não tenho ideia nenhuma, pode ser já isto? Ficava já despachada para amanhã.” Irene sorrira ao se aperceber que falavam da prenda para o Dia Oficial. Que romantismo!, claramente uma Maria! Continuando as suas compras, ficou com atenção ao diálogo: “...ou então, pode ser este perfume...?, é que nem sequer é caro!”
O grito masculino ecoou pelos corredores:
“N-Ã-Ã-Ã-O!!!!”
As pessoas, às compras, entreolharam-se, mas ninguém se pronunciou quando a discussão estalou. Num casamento, quem vai meter a colher? Irene também olhou por cima do ombro. Pensou que fossem mais velhos, mas era um casal muito novo, reconheceu a vergonha só no tremor do queixo daquela rapariga que continuava a dizer tontices com ar subserviente enquanto ele lhe virava as costas e a deixava a falar para as prateleiras.
Respeito. A ligeira diferenciação entre um casal e um Manel&Maria.
Quando saíram do restaurante, o casal da mesa do canto continuava a conversar. Nunca deram pelas outras pessoas que tanto os observaram.
Irene deu um último relance ao casal antes de sair.
Apeteceu-lhe, por um momento, que soubessem que eram o seu prémio casal da noite, afinal fizeram-na acreditar que não eram apenas os Manéis e as Marias que saltavam para fora de casa nesta noite... mas, sempre soube que casais como este, não celebra o seu Amor apenas porque algum grupo de comerciantes resolveu importar uma moda que nem é nossa para aumentar um pouco mais as vendas - criaram portanto este pomposo evento a comemorar – leia-se a comprar.
Sorriu ao casal da mesa do canto e pensou, apesar de ter escolhido o divórcio para si, viver a dois, vale realmente a pena - quando vale a pena, respirou fundo e imaginou todos os casais que sabem: alimentar o amor é uma tarefa diária, construtiva, constante... todos-os-dias-e-todas-as-noites-das-nossas-vidas.
Podia estar sozinha nessa noite, poderia continuar sozinha na vida, mas Irene sorriu. Enquanto esperavam para pagar, abriu o seu Moleskine e escreveu:

“Há é uma forma diferente de ver e viver a vida, o que nos torna loucos aos olhos dos que levam uma vidinha triste e sem sabor. A nossa, sabe a morangos com chocolate, até, quem sabe, sake e wasabi, se e quando deixamos a parte picante entrar na nossa vida.”





quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Black Swan

A busca pela personagem perfeita.
Até onde se vai na procura da excelência?
o processo criativo dói.
Um filme a não deixar de ver. Arrisca tornar-se um dos favoritos de sempre.


«“Black Swan” é um autêntico prodígio cinematográfico, cativante do início até ao fim e deslumbrante a todos os níveis possíveis e imaginários. No dia 27 de Fevereiro, a ver vamos se Aronofsky consegue fazer uma gracinha. É pouco provável. Mas isso também não importa. Porque, isto sim, é cinema em todo o seu esplendor! E não é uma estátua dourada que lhe vai acrescentar ou retirar qualquer mérito.» in Portal Cinema







terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Restaurante sem "V" de Volta

Só não digo em bom francês jamais, jamais, jamais porque sabemos o resultado que essa frase tem na nossa alma lusa. Mas este restaurante fica riscado do mapa e ficaremos com uma história triste para contar a nossos netos. A foto foi-nos tirada por um dos polícias, sim tivemos de chamar as autoridades para defender a nossa integridade física, e sim, uma das senhoras está grávida. Nada disto faz sentido nem deveria constar na mesma frase juntamente com jantar-convívio com os meus leitores, pois não? Mas aconteceu. O jantar  correu mal - mal servidos, mal jantados, mal me quero para toda a gente!!! ofereci livros a todos os presentes para tentar compensar o desconforto... ai!


Another World - Antony And The Johnsons

Situações caricatas do outro mundo eu costumo escrever com ligeireza nos meus livros. Até sou bem imaginativa, se pensar no que faço as minhas personagens passar - e os leitores gostam - mas não me passaria pela cabeça fazê-lo a pessoas reais. E inadvertidamente foi o que aconteceu. No restaurante que marcamos para o encontro da autora com os seus leitores, fomos mal tratados, mal recebidos, mal servidos e até ameaçados. Telefonei para as autoridades e pedi protecção. Depois de sairmos do local escoltados pelos simpáticos polícias o empregado finalmente deu asas à sua raiva - todos estávamos chocados com o sucedido e, já cá fora, podemos ver o senhor a partir copos e a pontapear o local onde tínhamos estado. Volto a repetir: Aconteceu. Não faz parte de nenhum conto meu, nem de ficção utilizada no romance sobre violência MAL ME QUERO.

A pergunta que me fica a matutar na cabeça é simples (presumo que a resposta não será). Porquê?



Mesinha de Cabeceira #2

de 8 fevereiro 2010


Hoje trago: 
«Fotobiografia da Sophia Mello Breyner» de Paula Morão e Teresa Amado
«José Afonso – Todas as Canções» de José Mário Branco, Guilhermino Monteiro, João Lóio e Octávio Fonseca
«Luanda 61» de Dalila Cabrita Mateus e Mateus

(e ainda uma sugestão de cinema)


08-02 MESINHA DE CABECEIRA by Radio Marinhais

JV – Bom dia! Hoje temos a Ana Martins directamente de Coimbra!
 E o que nos trazes hoje? Tiveste tempo de espreitar as livrarias?

AM – Ora bem: Hoje gostava de falar de autores portugueses. Começo por Sophia. Sai uma fotobiografia pela Editorial Caminho que acompanha a decisão familiar de doar todo o espólio da poetisa à Biblioteca Nacional. Assim, e também com este livro, fica lançada a intenção de deixar ao alcance de todos a vida e obra da escritora, mesmo o que não era conhecido. 

Depois quero falar de Zeca Afonso. Sai por mão da Assírio & Alvim um livro importante, onde por fim se reúne todas as partituras, todas as letras e todas as cifras das muitas músicas – 159 – que o cantor nos deixou. Foi um livro que tardou em aparecer, visto ser Zeca Afonso e por ser a primeira vez que se publica em Portugal uma obra completa de um cantautor. Apesar de estar a ser escrito há 6 anos, havia questões familiares, alheias aos autores que não os deixaram avançar com o projecto. Mas sai agora!, e nunca fica tarde para o que não tem tempo!
Por fim quero falar-vos de uma tema polémico que volta pela mão de Dalila Cabrita Mateus e seu marido Álvaro Mateus, publicado pela Texto Editora. Depois da «Purga em Angola» sai agora Luanda 61, por altura da comemoração dos 50 anos dos acontecimentos do 4 de Fevereiro de 1961- o irromper de um movimento que muitos consideram o princípio do declínio português face ao colonialismo. A tentativa de reconstruir uma realidade ocultada através da análise séria levada a cabo por estes autores de documentação da época, torna este segundo livro necessário. Eu apenas espero maior sorte e sucesso que com a «Purga de Angola». Cá estaremos para ver e escrever.

João Victor, não quero terminar esta rubrica de hoje sem deixar uma especial atenção, não a um livro, mas a um filme que está em exibição e considero imperdível: O Cisne Negro. A ver, a não perder, a deixar que todo o conteúdo se entranhe em todo o nosso ser!! É daqueles filmes que arriscam entrar directamente para os nossos favoritos de sempre. E agora, sim, até para a semana, que eu vou tomar um chazinho!



quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Shôr Victor

Parece-me que foi ontem, que o Shôr Victor da mercearia fez anos. Muito se tem falado no raio do homem. Fez 35, uma dezena e picos mais novo que eu, o que faz toda a diferença. Nunca simpatizei com ele, desde puto, era mesmo quase embirração com a atenção que lhe davam. Ainda agora entrei na mercearia, porque precisava de um pacote de leite, mas evito, não me inspira confiança aquele bigode a esconder a falta de dentes. E imaginar que o estafermo teve as maiores audiências televisivas há 25 anos!!
Hoje o puto seria uma aberração. Qual a probabilidade de se encontrar actualmente (imaginemos num prédio, em que cada apartamento há um criança da mesma idade), famílias inteiras sentadas no maple de napa da sala a ver, num só aparelho de televisão (a cores), o programa da noite? E ao som de um outro fedelho, todas as crianças se levantam, como o cãozinho de Pavlov, sabendo estar na hora da caminha, sem nunca esquecerem de escovar os dentes e sem sequer argumentarem? Hoje a criançada tem tv no quarto e mais uma quantidade de gadjets para sua distracção e sossego dos pais. Cada um dos pais biológicos em sua casa, bem entendido, que na actualidade haverá uma panóplia de realidades mais credíveis que a de há 25 anos. Num só prédio todos os condóminos estarem ainda no primeiro casamento e com filhos (vários) só do casal? Já não me parece nada natural e unificador a imagem serena na penumbra do quarto do petiz, da mãe que se verga a contar história de boa noite, que aconchega o cobertor e beija o filho enquanto o pai fica de pé, um passo atrás, de mãos nos bolsos cumprindo a sua função e só no final beija levemente a testa do miúdo para depois conduzir a mãe para o maple para assistirem na televisão ao programa de variedades da noite.
Só me dei conta, ao ouvir na mercearia «Parabéns Vitinho!» porque o shôr Victor andou toda a semana com o velho e irritante chapéu de palha: era a sua forma de comemorar. Devia ter arranjado umas jardineiras. Havia de ficar lindo, rimava mesmo com o bigode farfalhudo e a unha do dedo mindinho.

«O Vitinho foi um desenho animado de grande sucesso em Portugal, cujas transmissões duraram entre os anos de 1986 e 1997. A transmissão diária na televisão das películas "Boa noite, Vitinho!", sempre em horário nobre, atribuiu-lhe picos de audiência e uma admiração consensual: não só por parte das crianças, mas também por pessoas de todas as idades.» 
 Origem: Wikipédia 


terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Mesinha de cabeceira #1


de 1 fevereiro 2010


Hoje trago: «Mal Me Quero» de Ana Martins


JV – Vamos fazer a ligação à Ana Martins para dar início a este novo momento de literatura que hoje começa.
AM – Bom dia!
JV – Bem-vinda à Rádio Marinhais! Gostava de te perguntar porque chamaste à rubrica Mesinha de Cabeceira.
AM – Recordei um momento de uma conversa com um amigo meu, também autor, que me dizia que já tinha o meu livro e o tinha posto na mesinha de cabeceira, que lhe ia pegar assim que conseguisse, e como isso me deixou momentaneamente feliz. Esse meu amigo é o autor de uma das novelas que estão a passar neste momento e sei-o demasiado ocupado nesta altura a escrever, mas o meu livro, aguardava o seu momento no local mais mágico, onde guardamos o que vamos efectivamente ler e mais… ao colocar na mesinha de cabeceira, já o estamos a fazer com um carinho absolutamente diferente do desprendimento de guardar um livro novo na estante. Daí ter chamado assim esta rubrica. O logótipo que escolhi, uma mesa-de-cabeceira com uma imensa pilha de livros colocada numa praia, representa o que um livro pode fazer por cada leitor – fazê-lo viajar… sonhar mais além do horizonte.
JV – E conta-nos o que te vamos ouvir nesta rubrica todas as semanas à terça-feira?
AM – Justamente o que vai saindo de novo no mercado. É a minha visão sobre o que vale a pena ir parar à mesa-de-cabeceira dos nossos ouvintes.
JV – Falemos então do livro que também tenho na minha mesa-de-cabeceira. O teu mais recente romance MAL ME QUERO. É um tema quente onde abordas a violência doméstica.
AM – É verdade. Eu fiz muita pesquisa para este livro, e à medida que aprofundava, deparei-me com realidades que desconhecia ou que se calhar acabamos por não reparar num primeiro olhar. Chamei-lhe “os números calados”. Porque para além da violência mais comum de nos chama a atenção (o Manel que bate na Maria), há a violência na 3ª idade, que me chocou imenso, a violência na deficiência e a violência no namoro, como começam cedo demais.
JV – Pelo que já li, Ana, conseguiste escrever sobre várias situações…
AM – Sim, no Mal Me Quero pincelei várias realidades, não só a violência física do Manel e da Maria (porque não os exclui), mas escrevi sobre a violência verbal e a psicológica, que conseguem ser tão perversas quanto a física.
JV – Mas são muitas as tuas personagens! Percebo que era necessário para contares as várias histórias…
AM – A forma como estruturei o livro parece um livro de contos, mas é um romance. Apenas compartimentei cada realidade. Cada uma fica separada pelo facto de serem contos, aparentemente independentes, mas trata-se de um recurso literário para demonstrar que, tal como na vida real, o que acontece debaixo das telhas de um amigo, de um vizinho, fica lá, nós não sabemos, nunca sabemos e acontece mesmo ali ao nosso lado! O leitor vai sendo surpreendido pela forma como todas as personagens se cruzam sem nunca suspeitarem do que se passa na vida dos outros. E leva a aperceberem-se que como nunca pensamos que quem está perto de nós pode efectivamente precisar de ajuda sem nunca a pedir.
JV – Lá está, os números calados de que falavas à pouco…
AM – O medo, a vergonha do que vão dizer, paralisa a vítima. Fica prisioneira de uma teia de mentiras, que protege o agressor e faz com que ganhe terreno e continue. Só há uma forma de combater, João Victor, que é ter a coragem de falar. Denunciar a situação faz uma revolução na relação de poder entre agressor-vítima. E todos ficam a ganhar.
JV – Muito bem, e é um livro que consegues contar toda essa intensidade, mas também usas muito o sentido de humor… é para contrabalançar? Para equilibrar?
AM – Sim claro, além disso… faz parte da minha forma de ver a vida, transparece nos meus livros, na forma que construo as personagens ou nas soluções que lhes apresento. Os meus leitores dizem-me muitas vezes isso. Que não podem ler os meus livros em público porque são acometidos de gargalhadas ou porque choram no comboio ou no metro e enfim… são momentos de que deveriam ser privados. Mas de facto, de cada vez que me contam uma situação caricata, é um enorme elogio que cada um de meus leitores me está a fazer. Mexer com as emoções de uma pessoa é difícil e estão a dizer-me, sem o saberem, que o consegui. E eu fico grata. Muito grata.
JV – Essa é outra curiosa faceta tua enquanto escritora. O teu contacto com os leitores…
AM – É sim, prezo muito quem me lê e as opiniões que me dão. Se os leitores pensam que só eu lhes proporciono momentos perfeitos, enganam-se. Dão-me tanto em troca, mimam-me tanto e nem o sabem!!! Ou sabem, porque faço questão de lhes agradecer.
JV – E para garantir essa continuidade, vamos-te ter cá para a semana! Ana, muito obrigada. Mesinha de Cabeceira, hoje com destaque para o livro Mal Me Quero. E diz-nos, onde os nossos ouvintes podem encontrar o teu livro?
AM – No meu site. anamartinscom.blogspot.com – basta entrar em contacto comigo – uma mensagem , um email, até uma carta – os livros são enviados via CTT à cobrança, praticamente de um dia para o outro. Preço do livro + portes. Os meus contactos estão lá.
JV – Obrigada Ana e espero que esta rubrica de literatura que hoje começa se prolongue por muito tempo!
AM – Obrigada e até terça!




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