segunda-feira, 13 de março de 2023

Ana, porquê este livro novamente?

    E alguma vez saiu das nossas vidas? 
É uma resposta interessante, uma vez que, muito depois de estar esgotado, continuou a ser veementemente pedido – quase exigido!, – pelos leitores: foram os que emprestaram e não lhes foi devolvido, foram os que o queriam oferecer (à sogra, à madrinha, à professora, à terapeuta), de forma a “poder explicar o seu filho”, e, foram os que também queriam ler o livro pela primeira vez. 


    Deu-se um fenómeno aquando do lançamento em 2006 e ainda continua a ser um romance tão actual – Autista, quem…? Eu? – continua a ser verdadeiramente “um manual de boas-vindas ao autismo”. 
    Na releitura e revisão deste livro tomei a decisão de não mudar nada! O livro que ainda continua tão presente foi publicado em 2006, tal como as nomenclaturas que se usavam na época - Kanner, Asperger, def, criança 319 - que agora estão (estarão?) desactualizadas e/ou não são bem aceites socialmente. 
    
Na leitura deste livro, ficamos a saber de uma forma muito concreta a opinião que esta família tem acerca do chamado politicamente correcto…
 Nem sequer mudei detalhes que são tão despropositados agora, mas absolutamente adequados em 2006, como não ter rede de telemóvel no Metro ou a noção de que jamais se deveria comparecer a um jantar calçando sapatos de ténis. 
    Decidi igualmente utilizar o mesmo prefácio porque nenhum outro faria sentido! A Arq. Isabel Cottinelli Telmo é, para todos nós, uma voz que jamais será esquecida!, embaixadora do autismo pelo mundo afora, defendeu acerrimamente os direitos desta população como ninguém até então.
    A personagem/narrador Xavier, que nada sabe de Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), vai tomar o leitor pela mão e, à justa medida que vai questionando e entendendo o Xico, vai acompanhar o leitor através do seu natural raciocínio na sua descoberta do autismo. 
    Mais do que tudo, com este livro, pretendi que o leitor compreendesse e aceitasse esta população desconcertante, quiçá validasse também o meu filho… Jamais poderia imaginar o público que atingiu e o impacto que teve em mim, autora, ter a real percepção de como toquei a vida de tantas pessoas – e, aparentemente, continuo a tocar. 
    Nasceu uma nova geração de crianças com autismo e, aos novos pais, este livro tem passado de mão em mão; foi-lhes emprestado e cobrada a devolução. Sei porque me contam. Esse ripple effect continua a chegar até mim que o percebo continuadamente através das redes sociais, por email ou mensagem. As histórias continuam a ser-me confiadas, desabafadas num impulso ou explanadas ao detalhe. A todos ouço e respondo. Eu? Já comecei esta minha difícil travessia da “porta da dor” há 33 anos. 
    Eu sei. Não há quem nos entenda, a não ser as famílias onde o autismo pousou.
    Sim, temos médicos e técnicos que nos são próximos e nos ajudam pela vida afora!, mas às 18h tiram a bata e por muito próximos que sejam… não sabem. E ainda bem que técnicos de saúde e os outros pais de meninos ditos normais não o sabem! 
    Não podem saber! A porta da dor está, felizmente, numa outra dimensão que só quem a passa, sabe até onde dói. Diria até à unha do dedo grande do pé, e isto sou eu, que tenho muita resistência ao embate da dor. Quem pode aferir a dor alheia…? 
    Porém, após a tempestade, dizem que sempre vem a bonança. E é de momentos felizes que também este livro é feito. 
    A forma absolutamente desconcertante como um filho com autismo vê e percepciona este planeta onde vivemos, tira-nos o fôlego – porque convenhamos – podemos amar um filho até à Lua e voltar, mas não o podemos pôr numa redoma à espera que um Universo perfeito apareça como por milagre, venha, e encaixe nas particularidades de cada um dos nossos filhos! Este é o Mundo que temos para lhes oferecer, podemos, isso sim, mudar a nossa própria percepção, do que nos rodeia e ter uma visão diferenciada da que sempre nos acostumámos. 
    Uma geração inteira nasceu entre a estreia deste livro e esta edição nova que vos apresento. Atravessemos esta dura porta da dor juntos. Porque 33 anos de mãe ensinaram-me muita coisa e a primeira que me ocorre, caro leitor, é que estamos nisto juntos – não está só. 






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